quinta-feira, 4 de setembro de 2008

inferno

A, B e C, são elementos que fazem parte de sua vida, sendo objetos de pensamentos, preocupações, atos e conversas cotidianas. Para o único fim de compreensão, não importa aqui se tais elementos se referem a pessoas, grupos ou lugares.

Quando está no A, ou quando está entre os A, embora sinta-se à vontade, sente constantemente um leve desconforto e estranho sentimento de estar fora de lugar. Nesses momentos, sempre pensa que, caso estivesse em B, ou caso estivesse rodeado pelos B, certamente sentiria-se mais compreendido e realizado. "Aí sim eu estaria entre os meus", pensava satisfeito.

O fato de que mesmo quando se encontrava em ou entre os B, ainda assim não encontrava a satisfação esperada, era algo extremamente incômodo e sobre o qual relutava terminantemente em refletir com honestidade.

Nessas situações, o desejo de estar novamente em A, ou ainda, a intuição de que se não estivesse ali agora, mas se estivesse lá com os C no exato momento em que lhe invadia o desconcerto ante aos olhares perscrutradores dos B, dominavam-lhe com fúria suas emoções descontroladas.

Se a salvação, enfim, era estar em C, ou mesmo que o salvar-se fosse estar mergulhado nas relações com os C, era absolutamente inadmissível que sentisse - como de fato sentia - aquele vazio profundo que preencheria um abismo, no exato momento em que nada além ou aquém de e dos C estava diante de si.

Quando isso lhe ocorria, logo retornava também o desejo de estar em B, sem deixar de lhe ser claro, no entanto, de que mesmo quando os A estavam ao seu redor, também os C se faziam necessários mesmo encontrando-se ausentes.

Foi então na contradição do infindável ciclo de satisfação irrealizada, incompleta e incontrolável: serpente que devora infinitamente a si mesmo, que descobriu o inferno.

6 comentários:

Lúcia disse...

Adoreeeeeei! Muito bom... Sabe, Arekusu, seu conto me fez lembrar de um episódio de um desses seriados americanos antigos. Depois eu te conto. Mas a associação que fiz foi relacionada à essa sensação de insatisfação eterna. No episódio, o inferno é a eterna satisfação...
Precisamos conversar sobre isso um dia, certo?

Beijos e parabéns!

Rushia

Anônimo disse...

voce comeca no presente e no final do segundo paragrafo passa pro passado. eu li tudo no presente e gostei mais. assim fala direto com o leitor e nao da sensacao de ser algo distante.

Anônimo disse...

Esse texto me fez lembrar de uma frase de Sartre que você tanto gosta: "O INFERNO SÃO OS OUTROS".

Beijo,
Ivich

Alex P. disse...

Rushia, eu perdi o link que você me mandou sobre esse episódio da "satisfação eterna" ser o ou também o inferno.
E sim, conversar sobre o inferno é um dos meus assuntos favoritos..hehe...afinal eu já fiz catequese !

Alex P. disse...

Droguinhas: você tem razão. Começo o texto no tempo presente para depois, inexplicavelmente, colocá-lo no passado, para depois, também inexplicavelmente, voltar ao tempo presente.

Realmente a intenção era que essa impressão, ou antes, essa verdadeira vivência no "inferno", fosse mesmo algo próximo, como de fato o é.

Mais comentários berlinenses são bem vindos, hein ?

Alex P. disse...

Ivich: lembrou-se da frase de seu pai, é ? hehe Nesse caso, "o inferno são os outros", estando estes outros presentes ou ausentes, não é ?